Finanças comportamentais: a dinâmica comportamental do mercado de ações

Finanças comportamentais: a dinâmica comportamental do mercado de ações

As finanças comportamentais estudam a influência psicológica no comportamento dos investidores. Seu objetivo é mapear o efeito das emoções e outros fatores humanos na tomada de decisões no mercado financeiro.

Para entender o que isso quer dizer, existem três observações que parecem óbvias, mas que primeiramente devem ser reforçadas:

Acordo entre as partes

Toda negociação no mercado é formada pelo comum acordo entre duas partes para vender e comprar ativos. O preço de tela (cotação), por sua vez, é o valor das últimas negociações concretizadas.

Capitalização

Todos os valores financeiros observados são funções do preço de tela (cotação) dos ativos.

Isso significa que a capitalização de mercado de uma empresa é definida pelo produto entre o preço de tela (cotação) e a quantidade de ações de propriedade de acionistas, funcionários da empresa e investidores em domínio público.

Capitalização = Cotação / Quantidade de ações de propriedade de acionistas

Patrimônio e oscilação

O patrimônio de um investidor é contabilizado pelo produto entre o preço de tela (cotação) e a quantidade de ações em sua propriedade.

Patrimônio = Cotação / Quantidade de ações em sua propriedade

As observações acima implicam que o patrimônio de um investidor oscila em função do valor acordado por outros dois investidores, durante a negociação de um determinado ativo.

A importância de entender a dinâmica comportamental do mercado financeiro

Diante das pontuações acima, podemos dizer que é importante ter entendimento do comportamento do mercado porque a variação do patrimônio de um investidor depende diretamente dessa dinâmica.

Logo, a variação de preços e a consequente variação patrimonial dos seus investimentos dependem diretamente do conflito de opiniões e das tomadas de decisões de outros investidores.

Sendo assim, para compreender como navegar por essa dinâmica de preços é importante estudar como os players percebem informações e tomam decisões de investimento.

Como começou o estudo de finanças comportamentais

O estudo da natureza dos agentes sob uma ótica comportamental inicia-se em uma das obras mais influentes sobre psicologia social.

Em The Crowd: A Study of the Popular Mind, de 1896, Gustave Le Bon afirma que as principais características comportamentais de um grupo de indivíduos incluem impulsividade, irritabilidade, ausência de senso crítico e exagero de sentimentos [1].

Já em 1912, Selden escreve em Psychology of the Stock Market que os movimentos de preços dependem em grau considerável da atitude mental do público investidor e negociante [2].

Apesar dessas influências primordiais, a teoria sobre nossa capacidade de tomada de decisão encontra seus pilares inicialmente na teoria dos jogos, formulada a partir de uma descrição matemática – na denominada teoria da utilidade esperada.

De acordo com Von Neuman [3] e Bernoulli [4], nossas preferências em relação a decisões sob incerteza são medidas a partir do valor esperado dos possíveis cenários e dos resultados decorrentes da escolha de cada opção.

Processo de tomada de decisões sob incerteza

O processo de tomada de decisões sob incerteza de um investidor inclui um processo de:

  1. construção de cenários;
  2. atribuição de probabilidades;
  3. escolha da opção que fornece o maior retorno esperado.

Neste contexto, se todos os agentes de mercado fossem perfeitamente racionais, esperava-se que eles se comportassem da mesma forma quando lhes fossem apresentadas as mesmas informações.

Uma vez que as informações de mercado estão publicamente disponíveis, isso implicaria que o preço de um determinado ativo em um dado instante de tempo incorpora toda a informação disponível.

Diante dessas informações, o mercado seria considerado eficiente no sentido de que os ativos seriam negociados a preços justos. Como consequência, as oportunidades de lucros adicionais seriam inexistentes.

Apesar de elegante, a economia financeira falha em explicar fenômenos de caráter prático do mercado — o que, por sua vez, motivou o desenvolvimento da tese comportamental.

A Teoria das Finanças Comportamentais considera fatores psicológicos, emocionais e sociais como influentes na tomada de decisão dos investidores, visto que pessoas não se comportam de forma totalmente racional.

Estudo da tese comportamental

Na tese comportamental, diante das discussão sobre as tomadas de decisões dos indivíduos — baseada em fundamentos racionais ou influenciada por vieses cognitivos — o trabalho teve como escopo analisar, por meio de uma pesquisa descritiva, as exigências de prêmio por parte dos alunos do curso de Economia da UFPB.

A população foi classificada em quatro grupos, de acordo com o suposto nível de conhecimento sobre Finanças e Mercado Financeiro.

A amostra, por conveniência, correspondeu a 20 alunos em cada grupo e os dados foram coletados através da aplicação de questionários.

Os principais resultados indicaram de que, em média, os alunos que (teoricamente) detém menos informações ou conhecimento sobre o mercado financeiro apresentam um comportamento menos aversivo ao risco.

Também foi percebido que os grupos interpretam distintamente as diferentes medidas de riscos.

Constatou-se que as grandes diferenças quanto às exigências de prêmios entre os alunos podem ser justificadas pelas diferentes interpretações sobre os riscos e que, quanto maior o nível de conhecimento, menor a dispersão nessas exigências.

Vieses cognitivos e críticas à teoria da utilidade esperada

A crítica mais dura à teoria da utilidade esperada veio em 1979, pelo trabalho dos psicólogos Amos Tversky e Daniel Kahneman [5]. Eles descobriram que:

  • indivíduos calculam probabilidades incorretamente;
  • medem valor sempre em relação a um ponto de referência;
  • e avaliam ganhos e perdas de forma diferentes.

Eles foram responsáveis por popularizar o conceito de viés cognitivo, o qual é definido como o desvio sistemático da lógica e racionalidade durante o julgamento e tomada de decisão.

Segundo Kahneman e Tversky, os indivíduos criam sua própria “realidade subjetiva” a partir de sua percepção da informação e do contexto.

Logo, o seu comportamento é guiado pela sua própria construção e percepção da realidade e não a partir de uma descrição objetiva.

Em resumo, Kahneman e Tversky apresentaram, por meio de vários experimentos sociais e evidências empíricas, a presença da irracionalidade nas decisões humanas.

Por suas contribuições, Kahneman recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 2002, apesar de ser um psicólogo e não um economista. Se não fosse por sua morte prematura, Amos Tversky provavelmente teria compartilhado o prêmio.

A irracionalidade no mercado financeiro

Os avanços subsequentes nos estudos sobre a irracionalidade nos mercados incluem a incorporação da influência psicológica dos indivíduos na dinâmica de variação dos preços dos ativos.

Volatilidade

Em 1981, Shiller descobriu que a volatilidade do preço das ações é muito alta para ser atribuída a novas informações sobre fundamentos, lucros e dividendos [6]. Shiller foi premiado com o Nobel de Economia, em 2013.

Reações exageradas

Em 1985, Werner F. M. De Bondt e Richard Thaler publicaram “Does the stock market overreact?”, mostrando que as pessoas reagem exageradamente a eventos inesperados e dramáticos – causando ineficiências e distorções no preço dos ativos [7]. Thaler foi premiado com o Nobel de Economia em 2017.

Reação gradual

Em 1996, Chan, Jegadeesh e Lakonishok descobriram que o mercado reage apenas gradualmente a novas informações [8]. Ou seja, em alguns casos os agentes reagem excessivamente e em outros reagem minimamente às novas informações.

Efeito de disposição

Em 1999, Odean demonstrou que o volume de negociação nos mercados acionários é excessivo, e uma possível explicação é o excesso de confiança [9].

Ele também encontrou evidências de que é efeito de disposição que leva investidores a venderem ações lucrativas muito cedo, e a segurarem ações perdedoras por muito tempo [10].

Tomada de decisão em renda variável

A sequência de trabalhos e descobertas mencionada acima exemplifica três pontos que são extremamente importantes para se ter em mente ao investir em renda variável:

  1. As oscilações dos preços são governadas pelas decisões do público investidor e negociante;
  2. As decisões do público investidor e negociante são motivadas pela disponibilidade de informações e pela forma como cada um deles processa, incorpora e age sobre essa informação;
  3. Os investidores reagem as informações e tomam decisões de forma equivocada em muitos casos.

A irracionalidade nas suas decisões

A literatura comportamental conseguiu apresentar também o impacto de alguns desses vieses nas decisões individuais de cada investidor. Veja abaixo:

1 – Você evita realizar posições perdedoras.

Existe a crença errônea de que se o preço de uma ação caiu, o melhor a se fazer é segurar a ação ou comprar mais, desconsiderando a possibilidade de que ela pode cair ainda mais;

2 – Você realiza posições vencedoras cedo demais.

Da mesma forma, existe a crença de que se o preço de uma ação subiu, o melhor a se fazer é vender a ação, desconsiderando a possibilidade de que ela pode subir ainda mais.

É comum, ainda, ignorar o fato de que após a venda o capital precisará ser realocado.

3 – Você reage excessivamente a eventos extremos e dramáticos

A reação excessiva causada por eventos extremos, vinda de um alto volume de ordens, causa distorções nos preços dos ativos. Isso prejudica a tomada de decisão acertada.

4 – Você evita informações que confrontam o seu ponto de vista

Primeiro formam-se opiniões, em seguida buscam-se dados para embasar as suas crenças, ignorando ainda o que confronta a sua opinião.

5 – Você avalia ganhos/perdas de ativos individuais, não do portfólio como um todo

Não adianta comemorar a performance de um ativo se o portfólio não está indo tão bem. Seu portfólio é o seu patrimônio.

6 – Você negocia excessivamente quando está confiante

O excesso de negociações desencadeado por momentos de alta confiança pode incorrer em custos operacionais desnecessários e operações equivocadas.

7 – Você se prende a pontos de referência

Pode-se considerar pontos de referência algumas informações isoladas como o preço médio de compra em detrimento da performance e exposição do portfólio em comparação com o benchmark.

Percepções sociais nos investimentos

Além dos comportamentos citados, preconceitos psicológicos são reforçados por movimentos e percepções sociais porque os investidores estão sujeitos à dinâmica da psicologia de grupo.

Portanto, é provável que a sua opinião sobre o valor de uma ação seja afetada pelas opiniões de outros investidores. Como resultado, à medida que as opiniões se difundem em toda a população, os preços das ações flutuam de maneira semelhante ao que seria causado por modismos.

Baker e Wurgler, por exemplo, mostraram que um “índice de opiniões” é altamente correlacionado com o movimento dos mercados [11]. Isso significa que existe influência social direta na volatilidade de ativos.

Conclusões

Em resumo, a literatura de finanças comportamentais mostra que os mercados são guiados por percepções do público. Essas pessoas, por sua vez, nem sempre se comportam de forma totalmente racional, tomando decisões equivocadas e inserindo oscilações excessivas na dinâmica de preços.

Estes erros, por sua vez, podem levar a perdas permanentes de capital e performances medíocres de portfólios. Por isso, é importante ter um processo bem definido para tomar decisões.

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Abaixo, apresentamos as referências que constituíram a base do que hoje conhecemos como Economia Comportamental. Recomendamos a leitura para todos aqueles que queiram se aprofundar no tema.

Referências:

[1] G. le Bon, The Crowd: A Study of the Popular Mind, London: T. Fisher Unwin, 1896.

[2] G. C. SELDEN, Psychology of the Stock Market: Human Impulses Lead To Speculative Disasters, New York: Ticker Publishing, 1912.

[3] J. von NEUMANN e O. MORGENSTERN, Theory of Games and Economic Behavior, Princeton, NJ: Princeton University Press, 1944.

[4] D. BERNOULLI, “Exposition of a New Theory on the Measurement of Risk,” Econometrica, pp. 23-36, 1954.

[5] D. KAHNEMAN e A. TVERSKY, “Prospect Theory: An Analysis of Decision under Risk,” Econometrica, pp. 263-292, 1979.

[6] R. J. SHILLER, “Do Stock Prices Move Too Much to be Justified by Subsequent Changes in Dividends?,” The American Economic Review, pp. 421-436, 1981.

[7] W. F. M. De Bondt e R. THALER, “Does the Stock Market Overreact?,” The Journal of Finance, pp. 793-805, 1985.

[8] L. K. C. CHAN, N. JEGADEESH e J. LAKONISHOK, “Momentum Strategies,” The Journal of Finance, pp. 1681-1713, 1996.

[9] T. ODEAN, “Do Investors Trade Too Much?,” The American Economic Review, pp. 1279-1298, 1999.

[10] T. ODEAN, “Are Investors Reluctant to Realize Their Losses?,” The Journal of Finance, pp. 1775-1798, 1999.

[11] M. Baker e J. Wurgler, “Investor sentiment in the stock market,” Journal of Economic Perspectives, pp. 129-151, 2007.

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